O brasileiro lê em média 2,5 livros inteiros por ano. Além da bíblia, que vai aos poucos, um deve ser de auto-ajuda, o outro de espiritualidade, marketing digital ou alguma outra fórmula mágica pra ganhar dinheiro. 30% da população nunca comprou um livro na vida.
Se você só aceita conversar sobre política com quem tem uma carga de leitura acadêmica tão vasta como a sua, qual será a porcentagem da população brasileira apta a conversar com a vossa majestade?
Em um contexto de franca ascensão da extrema-direita, de destruicão dos direitos trabalhistas, biomas e mecanismos de proteção ambiental, em que os fascistas além de poder e dinheiro, possuem estratégias de comunicação de massa & robôs pra espalharem suas mentiras…
…a esquerda patina. O maior partido de “esquerda” perdeu sua conexão e comunicação com o povo e, apesar da popularidade de Lula, não consegue emplacar sucessores.
Enquanto isso, na sociedade civil, vivemos uma polarização baseada em mentiras e uma esquerda que por mais que seja minoria e esteja tomando na cara, não tem paciência pra dialogar. “Ai esses pobres burros que não sabem votar direito. Eu é que não vou me desgastar com esse povo, melhor cortar relações.“
No interior da “esquerda”, composta por uma multiplicidade de pequenos grupos, os monitores da turma, os mais avançados na teoria política, muitas vezes não tem a menor intenção, paciência ou vontade de ensinar quem está começando. Ironizam e descem os chicotes: “vá ler, burro“.
Ao invés de construir pontes, desqualificam, desmotivam e podam o interesse de seus interlocutores, ao invés de estimulá-los.
Se trago questionamentos a respeito de “quem pode ser considerado militante” não é por desejo de renovar minha carteirinha, nem por receio de que esta seja negada. Não é o título que almejo, mas antes o direito de fala.
Tanto por não acumular anos de leitura acadêmica quanto por ter pouca experiência prática nos modos tradicionais de militância e ativismo, muitas vezes me questiono sobre o meu direito de pensar e escrever sobre o tema.
Entretanto, a política me rouba o riso, o sono e a vontade de pôr filhos no mundo. É um assunto que está em meus lábios diariamente, em tudo quanto é ocasião (e não só em época de eleição) e com tudo quanto é tipo de gente.
Muitas vezes me sinto culpada por “encher o saco dos outros demais” ao postar constantemente sobre as desgraças do mundo enquanto a maioria das pessoas que sigo está preocupada em mostrar (ou simular) suas vidas perfeitas no Instagram… ao mesmo passo que me deparo com as limitações um tanto quanto óbvias do ativismo de sofá.
Há anos coloco nas metas de fim de ano “me juntar a algum coletivo”, “passar a atuar mais politicamente”. Mas não tendo simpatia especial por nenhum partido e nem muita fé na política institucional como um todo, acabo postergando a execução de minhas metas por uma falta de clareza sobre como agir e por onde começar.
E sei que não estou sozinha. Tem muita gente na mesma posição que eu:
Pessoas que mesmo sem uma grande formação teórica, olham para o mundo e são capazes de constatar o óbvio – que alguma coisa de muito errada não está certa – e estão interessadas em dar alguma contribuição, mínima que seja, para a construção de um mundo melhor…
Mas que se sentem tão de mãos atadas, tão sem exemplos e perspectivas, que se limitam a ler notícias e reclamar, ou pior ainda, algumas vezes passam a fechar completamente os olhos para a política para abrandar a dor da impotência. Como o mundo só desanda, a esperança mingua, foca-se no individual e foda-se o coletivo.
O que acaba dando duplamente errado. A salvação individual geralmente não vem, e no peito continua doendo aquela vozinha de que “eu queria, eu poderia, eu deveria fazer mais pelo todo; talvez assim minha vida fizesse um pouco mais de sentido“.
Partindo das minhas próprias necessidades, sei que precisamos de gente que fale simples, que traduza os escritos muitas vezes cifrados dos livros e transmita esse conhecimento de forma acessível, na linguagem do dia a dia.
Precisamos de exemplos práticos, que nos inspirem e sejam como uma lanterna a guiar o melhor caminho pra seguir. Precisamos ver pra crer que é possível.
Nesse sentido, posso começar doando o que tenho: minha escrita e minha capacidade de fazer perguntas. Meu silêncio não beneficia ninguém. Calada, ou tendo vergonha ou culpa de falar sobre isso, não estudo, não aprendo, não ensino. Sei pouco, mas meu interesse e desejo de aprender são legítimos.
Acredito que quem já acumula muita leitura de filosofia e ciência política ou muitos anos de militância não tenha muito pra aprender aqui, mas quem sabe não se disponha a compartilhar um pouco do que sabe.
Pupila é um espaço pra quem tá interessado em aprender junto e construir pontes. Pra quem tá mais interessado em trazer gente pra jogo do que tirar. É aquele velho papo: Aprender a ler pra ensinar os camaradas.
O objetivo aqui é construir um espaço autônomo na internet, transformar leitores de redes sociais em leitores de blog e leitores de blog em leitores de livros… e leitores de livros em escritores de livros; pensadores, criadores… revolucionários, enfim.
Aprender de quem já tá mais na frente; criar o desejo e o hábito de ler mais; mapear e construir possibilidades de ação no mundo; enriquecer nosso discurso e trazer ele pra prática.
Vamos juntos?
Deixamos aqui uma lista de caminhos diversos pra te inspirar a achar a sua maneira única de contribuir com o todo (claro que existem muitas outras além destas).
São muitas realidades e muitas formas de ação possíveis, dificilmente alguém conseguirá atuar em todas essas frentes ao mesmo tempo, mas cada um fazendo sua parte, pequena que seja, já vale.
- Assinar abaixo assinados;
- Compartilhar iniciativas que você acha que merecem destaque;
- Apoiar financeiramente os movimentos sociais e a mídia independente;
- Reduzir o consumo de carne e produtos oriundos do agronegócio;
- Comprar de produtores que você acredita;
- Direcionar seu consumo;
- Reduzir o consumo, reciclar;
- Plantar árvores ou se engajar em hortas urbanas;
- Estudar ciência política;
- Ser filiado à partido político,
- Encarar a política institucional;
- Fazer de parte de coletivo ou movimento independente;
- Fazer trabalho de base;
- Panfletar no centro da cidade;
- Produzir memes ou quadrinhos políticos;
- Escrever textão na internet;
- Fazer parte de um coletivo independente de notícias;
- Aprender e ensinar técnicas de segurança ou auto-defesa (física e virtual);
- Ser um instrumento de acolhimento e promoção de saúde em todos os níveis;
- Produzir ocupações culturais que tenham sentido além de artístico, político;
- Fazer arte que fale de temas que você acredita;
- Participar de manifestações de rua;
- Estar na linha de frente;
- Fazer ação direta;
- Plantar agro-florestas;
- Ser educador…
- …Ou simplesmente se dispor à ouvir e conversar com alguém que pensa diferente de você, não chamando quem tem menos informação ou instrução de burro, e sim criando formas didáticas e horizontais de apresentar seu pensamento à ele/a.